"QUALQUER UM PODE JULGAR UM CRIME TÃO BEM QUANTO EU, MAS O QUE EU QUERO É CORRIGIR OS MOTIVOS QUE LEVARAM ESSE CRIME A SER COMETIDO." (CONFÚCIO)

segunda-feira, 23 de maio de 2011

MEDIDAS CAUTELARES E FIANÇA: A REFORMA PROCESSUAL PENAL NA LEI 12.403/11 (PARTE 2)



Continuando com a exposição sobre os artigos modificados pela Lei 12.403/11, eventualmente analisaremos os artigos que tratam das medidas cautelares diversas da prisão, para que, assim, possamos encerrar os breves comentários desta lei.

O artigo 319, com a redação dada pela Lei passa a estabelecer medidas cautelares diversas da prisão. Na redação atual (anterior à Lei), estava previsto no artigo a prisão administrativa, espécie extirpada do Código pela nova reforma processual penal.  As medidas cautelares se compõem das seguintes modalidades, in verbis:
I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; 

II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; 
III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; 
IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; 
V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; 
VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; 
VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; 
VIII - fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; 
IX - monitoração eletrônica. 

Estas são medidas que serão aplicadas pelo juiz, isoladas ou cumulativamente, quando convenientes à instrução criminal. Encontram-se elencadas nos incisos do artigo 319 as chamadas cautelares de natureza pessoal, consoante recaem sobre o indivíduo diretamente.

Inovação trazida no texto é a previsão da cautelar de monitoramento eletrônico, já prevista na recente Lei 12.258, editada em de 15 de junho de 2010, que alterou alguns dispositivos da LEP. Agora, mormente em decorrência da previsão na legislação material, a cautelar não somente está apta a produzir efeitos na fase da execução penal, como também durante a fase de instrução.

Ao artigo 320 destinou-se reger a possibilidade de o imputado se ausentar do país, quando houver restrição neste sentido, a que o mesmo será obrigado a apresentar perante a autoridade competente o passaporte no prazo de 24 (vinte e quatro) horas.
Impera-se no artigo 321 o mandamento que aduz dever ao magistrado, sobre conceder a liberdade provisória ao imputado aplicando, quando for o caso, a respectiva cautelar dentre as elencadas no artigo 319, desde que previamente observados os requisitos inscritos no artigo 282.

Sobre o instituto da fiança foram destinadas várias alterações perante a legislação editada, por isso cabe reservar-lhe comentários mais minuciosos.

Na dicção do artigo 319, VIII, a fiança é medida cautelar que poderá ser concedida com a finalidade de se evitar a restrição da liberdade do agente, mas de forma a garantir, em linhas gerais, a contribuição do imputado ao procedimento sem que este venha a prejudicar o seu regular andamento, e enquanto não ocorrer decisão definitiva, isto é, o trânsito em julgado da sentença penal condenatória (art.334 do CPP), retendo-se os objetos e o dinheiro dados, ainda que advenha superveniente prescrição (art. 336 do CPP) para solver as custas, indenização do dano, prestação pecuniária e da multa, em havendo condenação. Mas havendo absolvição ou a fiança for declarada sem efeito, o valor prestado será restituído sem desconto, ressalvado o previsto no parágrafo único do supracitado artigo 336 do CPP.

Encontra-se previsto no artigo 322 que a fiança é cabível nos delitos em que a pena máxima privativa de liberdade não seja superior a 4 (quatro) anos, mas a critério da autoridade judicial, poderá, após decisão em prazo não superior a 48 (quarenta e oito) horas, ser concedida a delitos com pena superior ao previsto, conforme estipula o parágrafo único do referido artigo.

O artigo 323 vem a elencar as hipóteses em que a fiança não será permitida em decorrência da lesividade acometida ao bem jurídico penalmente tutelado pela norma, quais sejam os seguintes: crimes de racismo, tortura, tráfico ilícito de entorpecentes, terrorismo e hediondos, e nos crimes cometidos por grupos armados “contra a ordem constitucional e o Estado Democrático”.[i]

Igualmente não será concedida a fiança se houver a quebra da mesma, sem justo motivo, perante as obrigações elencadas nos artigos 327 e 328 do CPP[ii], havendo prisão civil ou militar decretada e, por fim, se preenchidos os requisitos para a decretação da prisão preventiva.

Em contraponto ao que é previsto na redação ainda vigente do Dec-Lei. 3.689/41 sobre permissividade ou negativa de concessão de fiança, existe uma abrangência maior de infrações a que se possa cominá-la com o advento da Lei 12.403/11, o que antes só era possível apenas aos delitos punidos com penas de detenção ou prisão simples, excetuando-se aqueles em que a pena mínima cominada for superior a dois anos, contravenções de vadiagem e mendicância (esta última expressamente revogada pela Lei 11.983/09 e pela própria Constituinte de 88), condenação por delito com pena privativa de liberdade transitada em julgado, em crimes com clamor público, violência contra a pessoa ou grave ameaça etc.

Acerca dos critérios de fixação do valor da fiança a Lei veio a instituir um teto maior, tendo sido aumentado para até 100 (cem) salários mínimos o limite quando de infrações com pena privativa de liberdade máxima de quatro anos e, sendo superior a este montante de pena, o limite é fixado em 200 (duzentos) salários mínimos. Dentre os valores, estabelece o § 1º do artigo 325, que, diante da “situação econômica do réu”, o juiz poderá dispensar a fiança, segundo a previsão do artigo 350 do CPP[iii], reduzi-la “até o máximo de dois terços” ou, diversamente, aumentá-la “em até 1.000 (mil) vezes”.

Sendo retardada a concessão da fiança por parte da autoridade policial, esta poderá ser pedida ao juiz competente, tanto pelo preso ou por representante, via de petição simples, a ser decidida no prazo máximo de 48 (quarenta e oito) horas (art. 335, CPP).

Os artigos 341, 343, 344, 345 e 346 sob a nova redação tratam da quebra e perda da fiança.
A quebra da fiança pressupõe que o imputado se mostra contrário à manutenção do procedimento, para tanto se omitindo ao comparecimento ou se opondo ao cumprimento de obrigações a ele impostas, praticando ato que obste o regular andamento procedimental ou praticando nova infração dolosa (art. 341). Com a quebra, o valor prestado poderá será perdido à metade e a autoridade judicial competente decidirá pela imposição de outras medidas cautelares ou mesmo pela imposição da prisão preventiva (art. 343) e, perdido na totalidade caso não compareça para cumprir a sanção imposta definitivamente (art. 344). Os valores deduzidos da fiança quando esta for quebrada, serão transmitidos ao fundo penitenciário, na forma dos artigos 345 e 346[iv].

Por fim, a Lei estabelece no artigo 439 que o “exercício efetivo da função de jurado constituirá serviço público relevante e estabelecerá presunção de idoneidade moral”, e inclui no Código de Processo Penal o artigo 289-A, que trata do banco de dados a ser instituído pelo CNJ em que será feito o imediato registro de mandados de prisão expedidos pelas autoridades judiciais do país, que permite a qualquer autoridade policial efetuar a prisão após verificada a autenticidade do mandado, que deverá ser comunicada ao juiz que a decretou, podendo o agente verificar acerca da identidade daquele a quem se pretende restringir a liberdade, aplicando-lhe o disposto no § 2o do art. 290[v], devendo ainda informar ao preso todos os seus direitos, conforme estabelece o inc. LXIII do artigo 5º, da Carta Magna, e fazendo ciente a defesa do mesmo, seja por advogado ou através da Defensoria, quando não for informado ou não houver causídico para representá-lo.

Conclui-se que em alguns dispositivos, a intenção do legislador foi a de restringir o uso banalizado da prisão preventiva, limitando as hipóteses de incidência, mas trazendo a aplicação de medidas cautelares mais adequadas à situação do imputado. Outrossim, para cautelares como a de monitoramento eletrônico e prisão domiciliar não se pode aferir de imediato qual a sua real consequência no sistema vigente, haja vista que é indiscutível a seletividade por determinados indivíduos, o que faz com, v.g. que o uso de uma pulseira, dada a sua visibilidade, venha a trazer marcas à constituição e definição da imagem do indivíduo.
Corroborando, a própria mídia faz com que se crie em torno de tal medida uma sensação de impunidade e insegurança, pois transmite a ideia de que qualquer indivíduo em qualquer grau de cumprimento de pena, pode se beneficiar da cautelar, significando um alarde na opinião pública, em que, para a mente da população que os mais perigosos ficarão livremente circulando dentro da sociedade...



Notas:

[i] Art. 323, III, CPP.
[ii] "Art. 327.  A fiança tomada por termo obrigará o afiançado a comparecer perante a autoridade, todas as vezes que for intimado para atos do inquérito e da instrução criminal e para o julgamento. Quando o réu não comparecer, a fiança será havida como quebrada."
"Art. 328.  O réu afiançado não poderá, sob pena de quebramento da fiança, mudar de residência, sem prévia permissão da autoridade processante, ou ausentar-se por mais de 8 (oito) dias de sua residência, sem comunicar àquela autoridade o lugar onde será encontrado."
[iii] Segundo o artigo 350, se for impossível ao réu a prestação da fiança, o juiz poderá dispensá-la e conceder-lhe liberdade provisória, desde que o mesmo se comprometa com o feito segundo o que regulamentam os artigos 327 e 328 do CPP. Lembrando-se que, quebrada a fiança sem justo motivo ou houver prática de nova infração
[iv] "Art. 345.  No caso de perda da fiança, o seu valor, deduzidas as custas e mais encargos a que o acusado estiver obrigado, será recolhido ao fundo penitenciário, na forma da lei.” (NR) 
"Art. 346.  No caso de quebramento de fiança, feitas as deduções previstas no art. 345 deste Código, o valor restante será recolhido ao fundo penitenciário, na forma da lei.” (NR) 
[v] "2o  Quando as autoridades locais tiverem fundadas razões para duvidar da legitimidade da pessoa do executor ou da legalidade do mandado que apresentar, poderão pôr em custódia o réu, até que fique esclarecida a dúvida."

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