"QUALQUER UM PODE JULGAR UM CRIME TÃO BEM QUANTO EU, MAS O QUE EU QUERO É CORRIGIR OS MOTIVOS QUE LEVARAM ESSE CRIME A SER COMETIDO." (CONFÚCIO)

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Informativo 644 do STF: Prazo para interporsição de Agravo em Recurso Extraordinário


Em informativo de jurisprudência, compreendido no período de 10 a 14 de outubro de 2011, foram proferidas algumas decisões de relevo pelo Supremo Tribunal Federal envolvendo matéria criminal.
Relativo à decisão em plenário os ministros decidiram acerca do prazo para a interposição de agravo em recurso extraordinário, ritualizado através da Lei 8.038/90.
Apesar de o agravante suscitar que o prazo para a interposição aplicado ao caso concreto seria o introduzido no ordenamento pela Lei 12.333/10, reafirmado pela edição da Resolução 451/10, qual seja o prazo de 10 (dez) dias, ficou consignado que aos agravos que versem sobre âmbito penal, diferentemente do processo civil em que se contabiliza o prazo mencionado, será aplicada a regra da apresentação do expediente processual ao termo de 5 (cinco) dias, por regrar-se o instituto através da Lei 8.038/90, consoante se estipulou com a edição do verbete sumular 699 do STF (O prazo para interposição de agravo, em processo penal, é de cinco dias, de acordo com a Lei 8.038/90, não se aplicando o disposto a respeito nas alterações da Lei 8.950/94 ao Código de Processo Civil) e não pela lex posteriori editada em 2010. Desta forma, foi improvido o recurso tendo em vista o escoamento do prazo.
ARE 639846 AgR-QO/SP

sábado, 22 de outubro de 2011

Informativo 484 do STJ

Neste último informativo de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça n. 484, relativo ao período de 26 de setembro a 07 de outubro de 2011, foram proferidas três decisões em âmbito penal. Confira abaixo a ementa publicada pela Secretaria de Jurisprudência do Tribunal.


QUINTA TURMA 

MAUS ANTECEDENTES. CONDENAÇÃO. PROCESSO CONEXO. INADMISSIBILIDADE.

Tendo em vista que uma mesma sentença julgou dois processos conexos, mostra-se inadmissível a consideração da condenação oriunda de um desses para fins de exasperar a pena-base do outro processo, como maus antecedentes, seja porque julgados numa mesma oportunidade, englobada e indissociadamente, seja porque a condenação não cumpriu, até então, o requisito do prévio trânsito em julgado. HC 143.026-RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 27/9/2011.


COMPETÊNCIA ORIGINARIA. TRIBUNAL. INSTRUÇÃO PRÉVIA. PRODUÇÃO. PROVA. IMPOSSIBILIDADE.

Nos procedimentos de competência originária dos tribunais não há possibilidade de uma fase instrutória prévia ao recebimento da denúncia, sendo defeso ao acusado requerer produção de provas nesse momento processual, tendo em vista que não existe ainda processo criminal instaurado contra ele. Antes do recebimento da ação penal, somente é cabível o oferecimento de defesa prévia. HC 198.419-PA, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 27/9/2011.

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SEXTA TURMA


HC. GESTÃO FRAUDULENTA. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. AÇÃO PENAL. TRANCAMENTO. POSSIBILIDADE.


Trata-se de habeas corpus em que se pretende o trancamento de ação penal referente ao crime de gestão fraudulenta de instituição financeira. Segundo a denúncia, o paciente, operador de mesa de corretora de valores, realizou uma única operação denominada day trade, juntamente com um dirigente de determinado fundo de pensão, em prejuízo deste último. A Turma entendeu que o crime do art. 4o, caput da Lei n. 7.492/1986 (gestão fraudulenta) é de mão própria e somente pode ser cometido por quem tenha poder de direção, conforme expressamente previsto no art. 25 da citada lei. Ademais, exige para a sua consumação a existência de habitualidade, ou seja, de uma sequência de atos perpetrados com dolo, na direção da instituição financeira, visando à obtenção de vantagem indevida em prejuízo da pessoa jurídica. A descrição de um só ato, isolado no tempo, não legitima denúncia pelo delito de gestão fraudulenta, como ocorre na espécie, onde o ora paciente está imbricado como mero partícipe, estranho aos quadros da instituição financeira, por ter efetivado uma operação na bolsa de valores, em mesa de corretora. Com essas considerações, entre outras, a Turma concedeu a ordem. HC 101.381-RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 27/9/2011.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Concedido HC para desclassificar crime de homicídio em acidente de trânsito



A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu, na tarde de hoje (6), Habeas Corpus (HC 107801) a L.M.A., motorista que, ao dirigir em estado de embriaguez, teria causado a morte de vítima em acidente de trânsito. A decisão da Turma desclassificou a conduta imputada ao acusado de homicídio doloso (com intenção de matar) para homicídio culposo (sem intenção de matar) na direção de veículo, por entender que a responsabilização a título “doloso” pressupõe que a pessoa tenha se embriagado com o intuito de praticar o crime.
O julgamento do HC, de relatoria da ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, foi retomado hoje com o voto-vista do ministro Luiz Fux, que, divergindo da relatora, foi acompanhado pelos demais ministros, no sentido de conceder a ordem. A Turma determinou a remessa dos autos à Vara Criminal da Comarca de Guariba (SP), uma vez que, devido à classificação original do crime [homicídio doloso], L.M.A havia sido pronunciado para julgamento pelo Tribunal do Júri daquela localidade.
A defesa alegava ser inequívoco que o homicídio perpetrado na direção de veículo automotor, em decorrência unicamente da embriaguez, configura crime culposo. Para os advogados, “o fato de o condutor estar sob o efeito de álcool ou de substância análoga não autoriza o reconhecimento do dolo, nem mesmo o eventual, mas, na verdade, a responsabilização deste se dará a título de culpa”.
Sustentava ainda a defesa que o acusado “não anuiu com o risco de ocorrência do resultado morte e nem o aceitou, não havendo que se falar em dolo eventual, mas, em última análise, imprudência ao conduzir seu veículo em suposto estado de embriaguez, agindo, assim, com culpa consciente”.
Ao expor seu voto-vista, o ministro Fux afirmou que “o homicídio na forma culposa na direção de veículo automotor prevalece se a capitulação atribuída ao fato como homicídio doloso decorre de mera presunção perante a embriaguez alcoólica eventual”. Conforme o entendimento do ministro, a embriaguez que conduz à responsabilização a título doloso refere-se àquela em que a pessoa tem como objetivo se encorajar e praticar o ilícito ou assumir o risco de produzi-lo.
O ministro Luiz Fux afirmou que, tanto na decisão de primeiro grau quanto no acórdão da Corte paulista, não ficou demonstrado que o acusado teria ingerido bebidas alcoólicas com o objetivo de produzir o resultado morte. O ministro frisou, ainda, que a análise do caso não se confunde com o revolvimento de conjunto fático-probatório, mas sim de dar aos fatos apresentados uma qualificação jurídica diferente. Desse modo, ele votou pela concessão da ordem para desclassificar a conduta imputada ao acusado para homicídio culposo na direção de veiculo automotor, previsto no artigo 302 da Lei 9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro).
KK/AD


Processos relacionados
HC 107801


segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Informativo 637 do STF - Prisão preventiva: nova lei e falta de fundamentação


"Ao aplicar a nova redação do art. 313, I ,do CPP [“Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva: I - nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos”], alterado pela Lei 12.403/2011, a 2ª Turma concedeu habeas corpus para cassar o decreto de prisão preventiva exarado em desfavor dos pacientes. Na espécie, eles foram acusados pela suposta prática dos delitos de resistência (CP, art. 329) e de desacato (CP, art. 331), ambos com pena máxima abstratamente cominada de 2 anos de detenção. Apontou-se que, com as inovações trazidas pela referida lei — a qual dispõe sobre matérias pertinentes à prisão processual, fiança, liberdade provisória, e demais medidas cautelares — a segregação, no caso, seria imprópria. Ademais, entendeu-se que o magistrado não reunira dados concretos hábeis a justificar a necessidade da constrição cautelar como meio necessário e inafastável para se resguardar a aplicação da lei penal. Ao contrário, assinalou-se que fora utilizado formulário padrão, previamente elaborado, o que evidenciaria, de forma flagrante, a ausência de individualização dos decretos prisionais."

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No julgamento do Habeas Corpus 107617/ES, em que atuou como Relator o Min. Gilmar Mendes, a Suprema Corte apresenta entendimento no sentido de reforçar o paradigma inserto no ordenamento processual penal pátrio pela Lei 12.403 de 04 de maio de 2011. 
Com a alteração da legislação processual, a aplicação do artigo 313 do CPP exige a observância dos requisitos elencados no art. 312 para a decretação da prisão preventiva ("garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria"), devendo o magistrado demostrar fundamentadamente a sua necessidade, conforme regra prevista na nova redação do art. 315 do mesmo diploma legal.
Ante a anterior ausência de expressa previsão no CPP acerca da necessidade de fundamentação do decreto prisional, apesar de constitucionalmente inscrita (art. 93, IX c/c art. 5º da CRFB/88), a prática forense demonstra que é corriqueira a decretação da prisão preventiva em que o magistrado apenas afirma existirem os requisitos, sem, contudo, enfrentar a situação que lhe é apresentada no processo, conforme mencionado na ementa do julgado acima transcrito.
Extrai-se da decisão que o relator considerou a "padronização" do documento utilizado pelo juízo coator, em que "constam espaços apenas para o preenchimento do número do processo, do nome do réu, da data designada para a audiência e da data de assinatura", ato que fere a individualização dos decretos prisionais, conforme requer o mandamento processual.
Por inobservância dos requisitos da nova lei, o relator destacou que, conforme há a omissão do magistrado no enfrentamento dos requisitos, a posição conservadora perante o processo impediu que fosse aplicada medida cautelar diversa da prisão, haja vista que o crime a que estão incursos os pacientes é cominada pena abstrata privativa de liberdade máxima inferior a 4 anos, que impede, a teor do inc. I do art. 313 do CPP, a decretação da prisão preventiva.
Desta forma, nos termos do art. 282 c/c art. 313 do CPP, ambos reformados pela Lei 12.403/11, existe nova possibilidade de se manter o acusado vinculado ao processo sem que para isso seja imprescindível a decretação de medida cautelar restritiva de liberdade, para que, frente ao caso concreto, a desmedida utilização da prisão preventiva não venha a produzir uma antecipação de pena que ao final do processo se mostre desproporcional ao caso concreto.
É certo que tal postura dos magistrados no cenário brasileiro decorre das raízes da legislação processual penal, que tiveram origem em uma época em que a autonomia do Poder Judiciário foi substituída pelo controle político ditatorial vigente em que a posição do julgador era de preservação do Estado contra o indivíduo, suprimindo-lhe garantias e aumentando o poder de fiscalização das autoridades públicas em seu desfavor.
Espera-se, por fim, que com as reformas legislativas até então apresentadas ocorra uma mudança na difícil tarefa de julgar e consequentemente na postura dos magistrados frente ao imputado. Busca-se mais e mais um processo que reforce as normas constitucionais, a fim de que se alcance um maior status democrático no regular desenvolvimento dos processos, visível, conforme têm demonstrando as cortes superiores nas decisões proferidas através de uma mudança de rumos.



sábado, 2 de julho de 2011

Remição da pena pelo tempo de estudo: a Lei 12.433 sancionada em 29 de junho de 2011

Com a aprovação do PLS 265/06, de autoria do Senador Cristovam Buarque, sancionado em 29 de junho de 2011 como Lei 12.433, a Lei de Execuções Penais (7.210/84) recebe uma gratificante alteração dos seus artigos 126, 127, 128 e 129, ao instituir que a pena poderá ser remida com base na fração de 1 dia por cada 12 horas de estudo.
A medida se estende desde a frequência em instituições de ensino regular quanto àquelas em que o estudo se realize pelo meio semi-presencial, mas desde que estejam necessariamente reconhecidas e certificadas pelas autoridades de educação.
Caso o imputado alcance graduação, seja em instrução fundamental, seja em nível superior e, sendo o curso certificado pelo Ministério da Educação, receberá o acréscimo de mais 1/3 do tempo remido.
Quanto ao tempo de trabalho, a Lei institui que será realizada a remição de 1 dia a cada 3 trabalhados.
Havendo a cumulação do trabalho com o estudo, os horários serão compatibilizados entre si, para viabilizar da melhor forma a aquisição do benefício penal pelo indivíduo encarcerado.
Cumpre atribuir elogios ao projeto bem como ao seu autor, consoante é ciente as falhas de uma vetusta legislação que ao se furtar de aplicabilidade à real necessidade social no sistema repressivo vigente, inova, elencando a educação como meio hábil ao fim que a pena [deveria] alcançar. 
É, de fato, um ganho significativo ao ordenamento que permite empreender as garantias de um Estado Democrático de Direito em um sentido de pena que não aquele definido apenas para expurgar o indivíduo como entidade criminosa do convívio social, mas para adequar e conscientizar este, a fim de, ao invés de ressocializá-lo, como nas palavras do professor Alvino Augusto de Sá, em artigo publicado no boletim de n. 223 do IBCCRIM[1], deve buscar reintegrá-los, porquanto "reintegração social não se alinha com nenhuma teoria sobre a função da pena. Parte-se da ideia de que ressocialização é um mito. Reconhece-se, porém, que o mito expressa grandes dramas existenciais humanos, ricos em contradições. O crime é um concentrado mítico de contradições humanas. A saída será a construção do diálogo entre cárcere e sociedade através de estratégias de reintegração social, a qual extrapola qualquer concepção sobre função preventiva da pena".
Importante implementar tais mudanças e que estas sejam tendentes a uma mudança de paradigmas, para que se perceba a real extensão dos efeitos que a integração insere na sociedade, pois apenas através da reestruturação de uma mentalidade arraigada no exclusivo punitivismo se poderá garantir a efetividade de políticas sociais visando a garantia de uma Constituição de plenos direitos aos cidadãos. Em síntese, assiste razão ao escritor russo Fyodor Dostoyevsky, ao afirmar que “não será preferível corrigir, recuperar, e educar um ser humano que cortar-lhe a cabeça?”.


Segue a íntegra da Lei.



LEI Nº 12.433, DE 29 DE JUNHO DE 2011

Altera a Lei no 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), para dispor sobre a remição de parte do tempo de execução da pena por estudo ou por trabalho. 

A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o  Os arts. 126, 127, 128 e 129 da Lei no 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), passam a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 126.  O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena.
§ 1o  A contagem de tempo referida no caput será feita à razão de:
I - 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar - atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional - divididas, no mínimo, em 3 (três) dias;
II - 1 (um) dia de pena a cada 3 (três) dias de trabalho.§ 2o  As atividades de estudo a que se refere o § 1o deste artigo poderão ser desenvolvidas de forma presencial ou por metodologia de ensino a distância e deverão ser certificadas pelas autoridades educacionais competentes dos cursos frequentados.
§ 3o  Para fins de cumulação dos casos de remição, as horas diárias de trabalho e de estudo serão definidas de forma a se compatibilizarem.
§ 4o  O preso impossibilitado, por acidente, de prosseguir no trabalho ou nos estudos continuará a beneficiar-se com a remição.
§ 5o  O tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 1/3 (um terço) no caso de conclusão do ensino fundamental, médio ou superior durante o cumprimento da pena, desde que certificada pelo órgão competente do sistema de educação.
§ 6o  O condenado que cumpre pena em regime aberto ou semiaberto e o que usufrui liberdade condicional poderão remir, pela frequência a curso de ensino regular ou de educação profissional, parte do tempo de execução da pena ou do período de prova, observado o disposto no inciso I do § 1o deste artigo.
§ 7o  O disposto neste artigo aplica-se às hipóteses de prisão cautelar.
§ 8o  A remição será declarada pelo juiz da execução, ouvidos o Ministério Público e a defesa.” (NR)

“Art. 127.  Em caso de falta grave, o juiz poderá revogar até 1/3 (um terço) do tempo remido, observado o disposto no art. 57, recomeçando a contagem a partir da data da infração disciplinar.” (NR)

“Art. 128.  O tempo remido será computado como pena cumprida, para todos os efeitos.” (NR)

“Art. 129.  A autoridade administrativa encaminhará mensalmente ao juízo da execução cópia do registro de todos os condenados que estejam trabalhando ou estudando, com informação dos dias de trabalho ou das horas de frequência escolar ou de atividades de ensino de cada um deles.
§ 1o  O condenado autorizado a estudar fora do estabelecimento penal deverá comprovar mensalmente, por meio de declaração da respectiva unidade de ensino, a frequência e o aproveitamento escolar.
§ 2o  Ao condenado dar-se-á a relação de seus dias remidos.” (NR)

Art. 2o  Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 29 de junho de 2011; 190o da Independência e 123o da República.

DILMA ROUSSEFF
José Eduardo Cardozo
Fernando Haddad"



[1] A reintegração social dos encarcerados: Construção de um diálogo em meio às contradiçõesIn Boletim IBCCRIM. São Paulo : IBCCRIM, ano 18, n. 223, p. 07-08, jun., 2011.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Informativo STF nº 631 - 13 a 17 de junho de 2011 - resumos


PLENÁRIO

Liberdades fundamentais e “Marcha da Maconha” - 1
Por entender que o exercício dos direitos fundamentais de reunião e de livre manifestação do pensamento devem ser garantidos a todas as pessoas, o Plenário julgou procedente pedido formulado em ação de descumprimento de preceito fundamental para dar, ao art. 287 do CP, com efeito vinculante, interpretação conforme a Constituição, de forma a excluir qualquer exegese que possa ensejar a criminalização da defesa da legalização das drogas, ou de qualquer substância entorpecente específica, inclusive através de manifestações e eventos públicos. Preliminarmente, rejeitou-se pleito suscitado pela Presidência da República e pela Advocacia-Geral da União no sentido do não-conhecimento da ação, visto que, conforme sustentado, a via eleita não seria adequada para se deliberar sobre a interpretação conforme. Alegava-se, no ponto, que a linha tênue entre o tipo penal e a liberdade de expressão só seria verificável no caso concreto. Aduziu-se que se trataria de argüição autônoma, cujos pressupostos de admissibilidade estariam presentes. Salientou-se a observância, na espécie, do princípio da subsidiariedade. Ocorre que a regra penal em comento teria caráter pré-constitucional e, portanto, não poderia constituir objeto de controle abstrato mediante ações diretas, de acordo com a jurisprudência da Corte. Assim, não haveria outro modo eficaz de se sanar a lesividade argüida, senão pelo meio adotado. Enfatizou-se a multiplicidade de interpretações às quais a norma penal em questão estaria submetida, consubstanciadas em decisões a permitir e a não pemitir a denominada “Marcha da Maconha” por todo o país. Ressaltou-se existirem graves conseqüências resultantes da censura à liberdade de expressão e de reunião, realizada por agentes estatais em cumprimento de ordens emanadas do Judiciário. Frisou-se que, diante do quadro de incertezas hermenêuticas em torno da aludida norma, a revelar efetiva e relevante controvérsia constitucional, os cidadãos estariam preocupados em externar, de modo livre e responsável, as convicções que desejariam transmitir à coletividade por meio da pacífica utilização dos espaços públicos. ADPF 187/DF, rel. Min. Celso de Mello, 15.6.2011. (ADPF-187) 

Liberdades fundamentais e “Marcha da Maconha” - 2
Decidiu-se, ainda, manter o objeto da demanda conforme a delimitação estabelecida pela Procuradoria-Geral da República, a despeito de um dos amici curiae — a ABESUP - Associação Brasileira de Estudos Sociais do Uso de Psicoativos — haver postulado o reconhecimento da legitimidade jurídica de determinadas condutas. A aludida associação pretendia a declaração da atipicidade penal de atos como o cultivo doméstico, o porte de pequena quantidade e o uso em âmbito privado da maconha; a utilização de referida substância para fins medicinais, inclusive para efeito de realização de pesquisas médicas; o uso ritual da maconha em celebrações litúrgicas; a utilização da substância canábica para fins econômicos; ou, então, a submissão dos mencionados pleitos a processo prévio de regulamentação, com a participação democrática dos órgãos e entidades que manifestassem interesse no assunto. O amicus curiae citado também requerera a concessão, de ofício, em caráter abstrato, de ordem de habeas corpus em favor de quaisquer pessoas que incidissem naqueles comportamentos anteriormente referidos. Aduziu-se que, não obstante o relevo da participação do amicus curiae, como terceiro interveniente, no processo de fiscalização normativa abstrata, ele não disporia de poderes processuais que, inerentes às partes, viabilizassem o exercício de determinadas prerrogativas que se mostrassem unicamente acessíveis a elas, como o poder que assiste, ao argüente, de delimitar o objeto da demanda por ele instaurada. Afirmou-se que a intervenção do amicus curiae seria voltada a proporcionar meios que viabilizassem uma adequada resolução do litígio constitucional, sob a perspectiva de pluralização do debate, de modo a permitir que o STF venha a dispor de todos os elementos informativos necessários à resolução da controvérsia, além de conferir legitimidade às decisões proferidas pela Suprema Corte. Para tanto, o amicus curiae teria a possibilidade de exercer o direito de fazer sustentações orais, além de dispor da faculdade de submeter, ao relator da causa, propostas de requisição de informações adicionais, de designação de peritos, de convocação de audiências públicas e de recorrer da decisão que haja denegado seu pedido de admissão no processo. Reputou-se, portanto, que as questões ora suscitadas não estariam em causa neste processo, muito embora reconhecida sua importância. Apontou-se, ademais, a inadequação do writ para o fim pretendido, visto que impetrado em caráter abstrato, sem vinculação concreta a um caso específico. Evidenciou-se a absoluta indeterminação subjetiva dos pacientes, de maneira a não se revelar pertinente esse remédio constitucional. Salientou-se que não se demonstrara configuração de ofensa imediata, atual ou iminente a direito de ir e vir de pessoas efetivamente submetidas a atos de injusto constrangimento. ADPF 187/DF, rel. Min. Celso de Mello, 15.6.2011. (ADPF-187) 

Liberdades fundamentais e “Marcha da Maconha” - 3
No mérito, ressaltou-se, de início, que o presente feito não teria por objetivo discutir eventuais propriedades terapêuticas ou supostas virtudes medicinais ou possíveis efeitos benéficos resultantes da utilização de drogas ou de qualquer outra substância entorpecente. Destacou-se estar em jogo a proteção às liberdades individuais de reunião e de manifestação do pensamento. Em passo seguinte, assinalou-se que a liberdade de reunião, enquanto direito-meio, seria instrumento viabilizador da liberdade de expressão e qualificar-se-ia como elemento apto a propiciar a ativa participação da sociedade civil na vida política do Estado. A praça pública, desse modo, desde que respeitado o direto de reunião, passaria a ser o espaço, por excelência, para o debate. E, nesse sentido, salientou-se que esta Corte, há muito, firmara compromisso com a preservação da integridade das liberdades fundamentais contra o arbítrio do Estado. Realçou-se que a reunião, para merecer a proteção constitucional, deveria ser pacífica, ou seja, sem armas, violência ou incitação ao ódio ou à discriminação. Ademais, essa liberdade seria constituída por 5 elementos: pessoal, temporal, intencional, espacial e formal. Ponderou-se que, embora esse direito possa ser restringido em períodos de crise institucional, ao Estado não seria permitido, em período de normalidade, inibir essa garantia, frustrar-lhe os objetivos ou inviabilizá-la com medidas restritivas. ADPF 187/DF, rel. Min. Celso de Mello, 15.6.2011. (ADPF-187)

Liberdades fundamentais e “Marcha da Maconha” - 4
Apontou-se, ademais, que as minorias também titularizariam o direito de reunião. Observou-se que isso evidenciaria a função contra-majoritária do STF no Estado Democrático de Direito. Frisou-se, nessa contextura, que os grupos majoritários não poderiam submeter, à hegemonia de sua vontade, a eficácia de direitos fundamentais, especialmente tendo em conta uma concepção material de democracia constitucional. Mencionou-se que a controvérsia em questão seria motivada pelo conteúdo polissêmico do art. 287 do CP, cuja interpretação deveria ser realizada em harmonia com as liberdades fundamentais de reunião, de expressão e de petição. Relativamente a esta última, asseverou-se que o seu exercício estaria sendo inviabilizado, pelo Poder Público, sob o equivocado entendimento de que manifestações públicas, como a “Marcha da Maconha”, configurariam a prática do ilícito penal aludido — o qual prevê a apologia de fato criminoso —, não obstante essas estivessem destinadas a veicular idéias, transmitir opiniões, formular protestos e expor reivindicações — direito de petição —, com a finalidade de sensibilizar a comunidade e as autoridades governamentais, notadamente o Legislativo, para o tema referente à descriminalização do uso de drogas ou de qualquer substância entorpecente específica. Evidenciou-se que o sistema constitucional brasileiro conferiria legitimidade ativa aos cidadãos para apresentar, por iniciativa popular, projeto de lei com o escopo de descriminalizar qualquer conduta hoje penalmente punida. Daí a relação de instrumentalidade entre a liberdade de reunião e o direito de petição. ADPF 187/DF, rel. Min. Celso de Mello, 15.6.2011. (ADPF-187)

Liberdades fundamentais e “Marcha da Maconha” - 5
Além disso, verificou-se que a marcha impugnada mostraria a interconexão entre as liberdades constitucionais de reunião — direito-meio — e de manifestação do pensamento — direito-fim — e o direito de petição, todos eles dignos de amparo do Estado, cujas autoridades deveriam protegê-los e revelar tolerância por aqueles que, no exercício do direito à livre expressão de suas idéias e opiniões, transmitirem mensagem de abolicionismo penal quanto à vigente incriminação do uso de drogas ilícitas. Dessa forma, esclareceu-se que seria nociva e perigosa a pretensão estatal de reprimir a liberdade de expressão, fundamento da ordem democrática, haja vista que não poderia dispor de poder algum sobre a palavra, as idéias e os modos de sua manifestação. Afirmou-se que, conquanto a livre expressão do pensamento não se revista de caráter absoluto, destinar-se-ia a proteger qualquer pessoa cujas opiniões pudessem conflitar com as concepções prevalecentes, em determinado momento histórico, no meio social. Reputou-se que a mera proposta de descriminalização de determinado ilícito penal não se confundiria com ato de incitação à prática do crime, nem com o de apologia de fato criminoso. Concluiu-se que a defesa, em espaços públicos, da legalização das drogas ou de proposta abolicionista a outro tipo penal, não significaria ilícito penal, mas, ao contrário, representaria o exercício legítimo do direito à livre manifestação do pensamento, propiciada pelo exercício do direito de reunião. O Min. Luiz Fux ressalvou que deveriam ser considerados os seguintes parâmetros: 1) que se trate de reunião pacífica, sem armas, previamente noticiada às autoridades públicas quanto à data, ao horário, ao local e ao objetivo, e sem incitação à violência; 2) que não exista incitação, incentivo ou estímulo ao consumo de entorpecentes na sua realização; 3) que não ocorra o consumo de entorpecentes na ocasião da manifestação ou evento público e 4) que não haja a participação ativa de crianças e adolescentes na sua realização. ADPF 187/DF, rel. Min. Celso de Mello, 15.6.2011. (ADPF-187)

Extradição e exame de insanidade mental
O Plenário deferiu, parcialmente, pedido de extradição instrutória e executória formulado pelo Reino da Espanha para fins de processamento de ações penais por delitos de estelionato e para cumprimento de pena privativa de liberdade de 4 anos, decorrente de condenação pela prática do mesmo crime e de falsificação. A defesa, em questão de ordem, alegara a necessidade de realização de exame de sanidade mental e a não-recepção do art. 84 da Lei 6.815/80 (“Efetivada a prisão do extraditando, o pedido será encaminhado ao Supremo Tribunal Federal”). No mérito, suscitara o abrandamento do Verbete 421 da Súmula do STF (“Não impede a extradição a circunstância de ser o extraditando casado com brasileira ou ter filho brasileiro”) e a conseqüente denegação do pedido extradicional. No que se refere à primeira questão de ordem, reputou-se, por maioria, que o processo extradicional se pautaria pelo princípio da contenciosidade limitada, de forma que não competiria ao Supremo indagar sobre o mérito da pretensão deduzida pelo Estado requerente ou sobre o contexto probatório em que a postulação extradicional se apoiaria. Vencidos, no ponto, os Ministros Marco Aurélio, Luiz Fux e Ayres Britto, que deferiam diligência para realização do aludido exame diante da sinalização do próprio Estado requerente quanto à saúde mental do extraditando e em virtude de a legislação brasileira prever a internação quando constatada a insanidade (CPP, art. 682). Quanto à segunda questão de ordem, consignou-se que, em inúmeros precedentes, o Tribunal teria afirmado a recepção do art. 84 da Lei 6.815/80. No tocante à matéria de fundo, asseverou-se a plena aplicação do Enunciado 421 da Súmula desta Corte. Por fim, reconheceu-se a inocorrência da dupla tipicidade do crime de falsidade de documento mercantil pela legislação brasileira. Ext 1196/Reino da Espanha, rel. Min. Dias Toffoli, 16.6.2011. (Ext-1196) 

Princípio da correlação e “emendatio libelli” - 4
Em conclusão, o Plenário, por maioria, desproveu terceiro agravo regimental interposto de decisão do Min. Ricardo Lewandowski que, dentre outras pretensões formuladas em ação penal da qual relator, acolhera emendatio libelli (CPP, art. 383) proposta pela acusação, em suas alegações finais, e desclassificara a imputação de lavagem de capitais (Lei 9.613/98, art. 1º) para o delito previsto na parte final do parágrafo único do art. 22 da Lei 7.492/86, que trata da manutenção de contas bancárias no exterior, sem a devida comunicação às autoridades federais competentes — v. Informativo 597. AP 461 Terceiro AgR/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 16.6.2011. (AP-461) 

Princípio da correlação e “emendatio libelli” - 5
Prevaleceu o voto do relator, que consignou que a emendatio libelli proposta não implicara aditamento da denúncia sob a perspectiva material, uma vez que os fatos imputados aos agravantes seriam os mesmos, independentemente de sua capitulação jurídica. Aduziu que o sistema jurídico pátrio exigiria a correlação entre os fatos descritos pela acusação e aqueles considerados pelo julgador na sentença. Desse modo, asseverou que o art. 383 do CPP exigiria que os fatos arrolados na denúncia permanecessem inalterados, como ocorrera na espécie, sem necessidade de reabertura da instrução ou complementação da defesa. Enfatizou que os réus defender-se-iam dos fatos que lhes são irrogados, qualquer que seja sua tipicidade penal, de modo que não haveria prejuízo a eles ou inépcia da inicial acusatória. Salientou que a nova capitulação proposta referir-se-ia a crime cuja pena cominada seria mais branda, o que, em princípio, mostrar-se-ia mais benéfico aos réus. Vencido o Min. Marco Aurélio, que provia os agravos por reputar que a hipótese configuraria mutatio libelli e, nesse sentido, a inobservância ao art. 384 do CPP inviabilizaria o direito de defesa. Frisava que os elementos configuradores dos crimes discutidos seriam diversos e que, no tocante à lavagem de capitais, impor-se-ia a demonstração de crime antecedente, o que não teria sido realizado. AP 461 Terceiro AgR/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 16.6.2011. (AP-461)

Princípio da correlação e “emendatio libelli” - 6
Em seguida, o Plenário decidiu, por maioria, não acolher proposta do Min. Dias Toffoli, trazida em voto-vista, no sentido de conceder habeas corpus de ofício aos réus e trancar a ação penal — apenas parcialmente em relação à co-ré —, em razão da atipicidade da conduta imputada, relativa à manutenção de contas bancárias no exterior sem a devida comunicação às autoridades federais competentes. Entendia, no que foi acompanhado pelo Min. Marco Aurélio, que algumas contas às quais a acusação se refere não teriam sido objeto de qualquer movimentação financeira; outra teria sido aberta e encerrada no mesmo ano, e seu capital transferido a uma nova conta, devidamente declarada ao Fisco; e as demais também declaradas às autoridades fazendárias. Afirmava que a única conta passível de tipicidade teria como titular a co-ré, que não deteria foro na Corte, razão pela qual determinava a baixa dos autos à justiça comum, para que a ação prosseguisse apenas em relação a esse fato. Por fim, o Colegiado reputou que as questões que fundamentariam eventual concessão da ordem de ofício deveriam ser por ele deliberadas no momento próprio para a análise o mérito da ação, consideradas todas as provas colhidas e as declarações proferidas pelas partes ao longo do processo, que não se encerrara.

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PRIMEIRA TURMA

Crime contra a ordem tributária e pendência de lançamento definitivo do crédito tributário - 4
Em conclusão, a 1ª Turma, por maioria, denegou habeas corpus em que acusado da suposta prática dos crimes de formação de quadrilha armada, lavagem de dinheiro, crime contra a ordem tributária e falsidade ideológica pleiteava o trancamento da ação penal contra ele instaurada, ao argumento de inépcia da denúncia e de ausência de justa causa para a persecução criminal, por se imputar ao paciente fato atípico, dado que o suposto crédito tributário ainda penderia de lançamento definitivo — v. Informativos 582, 621 e 626. Frisou-se que tanto a suspensão de ação penal quanto o trancamento surgiriam com excepcionalidade maior. Considerou-se que a denúncia não estaria a inviabilizar a defesa. Reputou-se, por outro lado, que o caso versaria não a simples sonegação de tributos, mas a existência de organização, em diversos patamares, visando à prática de delitos, entre os quais os de sonegação fiscal, falsidade ideológica, lavagem de dinheiro, ocultação de bens e capitais, corrupção ativa e passiva, com frustração de direitos trabalhistas. Concluiu-se não se poder reputar impróprio o curso da ação penal, não cabendo exigir o término de possível processo administrativo fiscal. O Min. Ricardo Lewandowski, destacou que o caso não comportaria aplicação da jurisprudência firmada pela Corte no julgamento do HC 81.611/DF (DJU de 13.5.2005), no sentido da falta de justa causa à ação penal instaurada para apurar delito de sonegação fiscal quando ainda não exaurida a via administrativa, e, por conseguinte, não constituído, definitivamente, o crédito tributário. Por fim, acrescentou que a análise da conduta do acusado constituiria matéria probatória a ser apreciada pelo juiz natural da causa no curso da ação penal, de modo que não se cogitaria, de plano, afastar a imputação do referido crime. Vencido o Min. Dias Toffoli, que concedia a ordem apenas para trancar, por ausência de justa causa, a ação penal instaurada contra o paciente pelo crime previsto no art. 1º, II, da Lei 8.137/90.
HC 96324/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 14.6.2011. (HC-96324)

ED: dosimetria e circunstância judicial
A 1ª Turma iniciou julgamento de embargos declaratórios opostos de acórdão denegatório de habeas corpus impetrado em favor do paciente, submetido ao tribunal do júri por homicídio simples. A Min. Cármen Lúcia, relatora, rejeitou os embargos, no que foi acompanhada pelo Min. Luiz Fux. Afirmou que, no julgamento do writ, consignara-se que a alteração da pena exigiria o revolvimento de prova, atividade incompatível com os limites do habeas. Asseverou inexistir contradição, porquanto a pena definida não representaria afronta à lei. Verificou que se pretenderia, em embargos, reexaminar o que decidido na Turma. Considerou, por fim, não ser hipótese de concessão da ordem de ofício. Em divergência, o Min. Marco Aurélio deferiu, de ofício, o writ para fixar a reprimenda em 5 anos e 6 meses, ou seja, pena-base de 6 anos com redução de 6 meses pela confissão espontânea. Assinalou que, ao se pronunciar o paciente, não fora articulada qualquer das qualificadoras; tampouco, por elas denunciado. Entendeu que, no entanto, o juiz-presidente evocara na primeira fase da dosimetria, a título de circunstâncias judiciais, dados que consubstanciariam qualificadoras como o motivo fútil e a surpresa da vítima. Ressaltou que a sentença não aludiria a qualquer outra circunstância judicial. Concluiu que aqueles aspectos não poderiam ser considerados à luz do art. 59 do CP. Após, pediu vista o Min. Dias Toffoli.
HC 107501 ED/GO, rel. Min. Cármen Lúcia, 14.6.2011. (HC-107501)

terça-feira, 21 de junho de 2011

Erro de Tipo e Erro de Proibição


Previstos nos artigo 20 e 21 do Código Penal, o erro de tipo e o erro de proibição se configuram como a falsa percepção acerca de fatores atinentes à composição do delito, podendo recair sobre as elementares do tipo - logo, erro de tipo - ou sobre o caráter da ilicitude de uma dada conduta, quer dizer, o agente não vislumbra a ilicitude em que se encontra, dado essencial na caracterização da culpabilidade do agente, que exige potencial consciência da ilicitude.
O erro de tipo pode ser conceituado, então, como a falsa percepção da realidade que atua sobre as elementares constitutivas do tipo. Sobre estas, recordemos que são as elementares e as circunstâncias. Elementares são os dados essenciais, sem os quais, não se pode falar em crime; brevemente, as elementares se subdividem em objetivos (verbo, lugar do crime, modo de execução etc), subjetivos (intenção do agente) e normativos (a serem verificados pelo magistrado, podendo constituir condições para a aplicação do tipo, como nos crimes que somente podem ser cometidos por funcionário público). Quanto às circunstâncias, estas, se subdividem ainda em judiciais, que são as previstas no artigo 59, caput, do CP, e as legais, sejam genéricas (estabelecidas na parte geral do CP) ou específicas (previstas em sua parte especial).
O erro de tipo poderá ser essencial ou acidental. Será essencial quando o agente não perceber que a conduta praticada constitui um delito. Se assim agir, o dolo será excluído, não respondendo pela intenção de praticar a conduta que viola o bem juridicamente tutelado pela lei penal; se inevitável o erro essencial, será excluido, além do dolo a culpa, mas se for evitável, responderá o agente a título de culpa quando esta for prevista.[1]
Diversamente, erro de tipo acidental é aquele em que o agente sabe que a conduta praticada é ilícita, mas se engana quanto ao objeto material (coisa ou pessoa), a execução (aberratio ictus ou aberratio criminis) ou sobre o nexo de causalidade.
Erro de tipo acidental sobre o objeto material evidencia-se da seguinte forma:
a) Erro sobre a pessoa: existe uma confusão mental do agente sobre a pessoa a ser atingida com a conduta. Neste caso, responderá o agente por dolo. Exemplo corrente é aquele em que A pretendendo matar seu pai, ao encontrar se tio, que é gêmeo desse, de costas, a quem acredita veemente ser seu genitor, profere contra o mesmo disparo de arma de fogo em que o projétil causa ferimento fatal. Responderá pelas penas do artigo 121 c.c art. 61, II, e, CP.
b) Erro sobre o objeto: em que o objeto a ser atingido é diverso do pretendido pelo agente. Ex: “Imaginemos um furto, em que sujeito pretenda ingressar em um comércio para subtrair produtos importados e revendê-los, mas por equívoco, leva produtos nacionais”.[2]
Adiante, o erro sobre a execução pode se configurar nas seguintes modalidades:
a) “Aberratio Ictus” – ocorre quando o agente pretendendo atingir determinada vítima, atinge terceiro diverso (resultado único) ou atinge tanto a vítima quanto ao terceiro (resultado duplo). Responderá o agente por intenção dolosa, conforme prevê o artigo 73 c.c art. 20 do CP.[3]
b) “Aberratio Criminis” ou “aberratio delicti” – neste, o agente atinge bem jurídico diverso do pretendido, isto é, quando a intenção é a de lesionar, v.g., o patrimônio de outrem, mas acaba por atingir a sua integridade física, lesionando gravemente. Nesta modalidade de erro de tipo, a responsabilização será auferida a título de culpa, quando esta estiver prevista na legislação, conforme estipula o artigo 74 do CP.[4]
Acerca do erro sobre o nexo de causalidade, neste o agente pratica uma única conduta em que visa determinado resultado, mas que por fato diverso do praticado é alcançado.
Mais adiante, erro de proibição é aquele em que o agente encontra-se em falsa percepção da ilicitude do fato, ou seja, o agente sabe exatamente o que faz, pois tem ciência dos fatos da realidade, mas apenas desconhece que a conduta praticada encontra-se prescrita como ilícita na legislação penal. Difere-se do desconhecimento da lei penal, pois esta, conforme o caput do artigo 21 do Código Penal, é inescusável, mas refere-se ao erro quanto a interpretação proibitiva da lei, quanto às causas que excluem a ilicitude ou acerca dos limites jurídicos que fixam as excludentes de ilicitude.[5]
Estabelece o artigo 21 e seu parágrafo único:
Art. 21 - O desconhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)Parágrafo único - Considera-se evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato, quando lhe era possível, nas circunstâncias, ter ou atingir essa consciência. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
É saliente que o erro de proibição igualmente ao erro de tipo se subdivide em evitável ou inevitável e, tão somente quando for inevitável, isentará o agente de pena, pois conforme já mencionado anteriormente, exige-se, para considerar o indivíduo culpável, que este necessariamente possua conhecimento acerca da ilicitude do fato punível.
Enfim, as formas de manifestação do erro constituem métodos de avaliar se o agente, ao momento da conduta, a praticava em plena consciência do seu caráter ilícito, fato que se confirmado, não restará qualquer benefício na imposição da pena, respondendo o mesmo conforme a medida da culpabilidade dos atos praticados; mas, ainda sim, se houver a negativa de consciência, a responsabilização integral do imputado restará prejudicada, fazendo este jus a qualquer das causas de diminuição ou isenção de pena previstas nos artigos ora apresentados.



[1] Ver. art. 18 do CP, que estabelece o conceito de dolo e culpa e, reserva que só haverá a responsabilização penal por culpa quando esta estiver prevista: Parágrafo único - Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente.
[2] ETEFAM, André. Direito Penal. Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 228.
[3] Art. 73 - Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela, atendendo-se ao disposto no § 3º do art. 20 deste Código. No caso de ser também atingida a pessoa que o agente pretendia ofender, aplica-se a regra do art. 70 deste Código.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
[4] Art. 74 - Fora dos casos do artigo anterior, quando, por acidente ou erro na execução do crime, sobrevém resultado diverso do pretendido, o agente responde por culpa, se o fato é previsto como crime culposo; se ocorre também o resultado pretendido, aplica-se a regra do art. 70 deste Código.  (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
[5] DELMANTO, Celso... et al. Código Penal Comentado. 6. ed. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 20-21.







quinta-feira, 16 de junho de 2011

Crime de Tráfico Internacional de Entorpecentes e a decisão do STJ: não é necessário a transposição de fronteira

Segundo a decisão proferida pela Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça em sede de julgamento de Habeas Corpus, não é necessária a efetiva transposição de fronteiras para a caracterização de tráfico internacional de drogas, desde que a intenção do agente seja de assim proceder.
No caso julgado o Relator Min. Og Fernandes entendeu quanto à transnacionalidade, sobre a qual repercute a incidência da majorante ao réu, prevista na Lei 6.368/76 em seus artigos 12, caput c/c art. 18, inc. II, assiste razão ao Tribunal de origem em aplicá-la, haja vista que as circunstâncias em que o agente fora preso evidenciaram a sua intenção em evadir-se do país transportando consigo a droga neste recebida, além de estar em poder de passagens aéreas, bilhetes de embarque, o que demonstrou efetivamente a conduta do agente dirigida à prática do delito.


Para saber mais: Site do STJ

terça-feira, 7 de junho de 2011

Se réu tem direito a semiaberto, não pode ficar preso

Na falta de presídio que permita o cumprimento da pena em regime semiaberto, preso deve ficar no regime aberto ou em prisão domiciliar. Esse foi o entendimento da 6ª Turma do STJ, ao conceder Habeas Corpus a um preso beneficiado com a progressão para o regime semiaberto, que continua em regime fechado por falta de local para cumprimento da pena mais branda.
Os ministros determinaram que ele seja imediatamente transferido para um estabelecimento compatível com regime semiaberto ou, na falta de vaga, que aguarde em regime aberto ou prisão domiciliar. "Constitui ilegalidade submetê-lo, ainda que por pouco tempo, a local apropriado a presos em regime mais gravoso, em razão da falta de vaga em estabelecimento adequado", explicou o ministro Og Fernandes, relator do HC.
O preso foi condenado por homicídio duplamente qualificado. Ele obteve a progressão prisional em outubro de 2010, e deverá cumprir pena até outubro de 2012. Até o julgamento do HC pelo STJ, ele continuava recolhido em regime fechado na Penitenciária de Paraguaçu Paulista (SP), por falta de vaga no regime semiaberto.
A Justiça paulista havia negado o HC por entender que a falta de vagas no regime semiaberto, "embora injustificável por caracterizar eventual desídia estatal", não poderia justificar uma "precipitada e temerária soltura de condenados". Contudo, o STJ considera que a manutenção da prisão em regime fechado nessas condições configura constrangimento ilegal. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
HC 196.438

quarta-feira, 25 de maio de 2011

ConJur: Advogado pode acessar processo sem procuração

O advogado pode acessar livremente qualquer processo eletrônico, mesmo quando não possuir procuração nos autos. A conclusão é do Conselho Nacional de Justiça, que tornou sem efeito o Provimento 89/2010, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, e a Resolução TJ/OE 16/2009, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
Na decisão, o CNJ declara que "aos advogados não vinculados ao processo, mas que já estejam credenciados no tribunal para acessarem processos eletrônicos (artigo 2º da Lei 11.419/2006), deve ser permitida a livre e automática consulta a quaisquer autos eletrônicos, salvo os casos de processos em sigilo ou segredo de Justiça". 
O conselho também determinou que os sistemas dos tribunais "devem assegurar que cada acesso seja registrado no sistema, de forma a que a informação seja eventual e posteriormente recuperada, para efeitos de responsabilização civil e/ou criminal, vedando-se, desta forma, a pesquisa anônima no sistema".
As normas do TRF-2 e do TJ-RJ determinam que o advogado sem procuração e que queira ter acesso aos autos do processo eletrônico deve peticionar ao juíz competente.
Autor da ação, o presidente da OAB-RJ, Wadih Damous, afirmou que a decisão é "uma vitória da advocacia brasileira". Segundo ele, o processo digital pode ser um avanço na celeridade processual, mas precisa ser melhor regulamentado para não trazer prejuízos aos jurisdicionados e a seus defensores, que são os advogados.
O presidente em exercício da OAB Nacional, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, considera que "na realidade, o CNJ fez cumprir a sua própria Resolução 121, a Lei 11.419 e a prerrogativa do advogado de acesso aos autos, sem a qual o direito a ampla defesa ficaria prejudicado. O acesso aos autos não poderia ficar vinculado a um juízo discricionário do juiz, porque se trata de uma garantia prevista em lei para o exercício da profissão".
Prerrogativa
A OAB-RJ alegou que, muitas vezes, os advogados precisam ter acesso automático a qualquer processo, quando assumem uma causa em andamento e precisam dar uma resposta urgente ao cliente, às vezes no mesmo dia. Nesse sentido, a entidade observa que exigir pedido escrito antes da vista do processo inviabilizaria essa atuação.

Para fundamentar o pedido, a Seccional carioca se embasou, dentre outros, no artigo 5º, inciso LX, da Constituição, que diz que "a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem".
No memorial assinado por Ronaldo Cramer e Guilherme Peres de Oliveira, procurador-geral da OAB-RJ e subprocurador-geral, respectivamente, é dito que "não pode o intérprete (no caso, o TRF-2) criar restrição interpretativa não criada pela Constituição, no sentido de que apenas os pronunciamentos judiciais seriam públicos, já que o conceito de 'atos processuais' é evidentemente mais amplo".
Limites
O TRF-2 se manifestou esclarecendo que  a Resolução 121/2010 do CNJ exige que haja demonstração do interesse, e o Provimento de sua Corregedoria só identificou a autoridade que vai apreciar o pedido.

O tribunal também alega que a preservação do sigilo processual não se restringe às situações de segredo de justiça, mas também engloba processos que contenham documentos, dados ou informações protegidos por sigilo por disposição constitucional ou legal (como documentos e dados bancários, fiscais e financeiros), "cujos atos processuais, no entanto, podem ser praticados sem restrição à publicidade que lhes é inerente".
O TJ-RJ também se manifestou, dizendo que nem todas as informações existentes nos processos eletrônicos podem ser disponibilizadas a terceiros, e que há diferença entre publicação e divulgação da informação, e a publicidade excessiva viola princípios constitucionais como a intimidade e a personalidade.
Por fim, o CNJ deixou claro que "não deve haver qualquer juízo de admissibilidade prévia para que tal acesso ocorra, nem da secretaria da vara nem do juízo". Com informações da Assessoria de Imprensa da Ordem dos Advogados do Brasil.
Clique aqui para ler o voto do relator.
Clique aqui para ler o memorial apresentado pela OAB-RJ.



A REFORMA PROCESSUAL PENAL: A LEI 12.403 DE 04 DE MAIO DE 2011


Definitivamente sancionada nesta quarta-feira, 04 de maio de 2011, entra em vigor após transcorridos 60 dias de sua publicação, a Lei 12.403 que versa sobre a alteração de alguns dispositivos constantes do Código de Processo Penal vigente.

A nova lei vem a modificar a redação dos seguintes artigos do CPP: 282, 283, 289, 299, 300, 306, 310, 311, 312, 313, 314, 315, 317, 318, 319, 320, 321, 322, 323, 324, 325, 334, 335, 336, 337, 341, 343, 344, 345, 346, 350 e 439; revogando os seguintes: o art. 298, o inciso IV do art. 313, os §§ 1º a 3º do art. 319, os incisos I e II do art. 321, os incisos IV e V do art. 323, o inciso III do art. 324, o § 2º e seus incisos I, II e III do art. 325 e os arts. 393 e 595; além de incluir o artigo 289-A.

De forma breve podemos analisar a modificação no regramento processual penal e tentar traçar uma ideia inicial acerca dos seus efeitos perante a aplicação prática da legislação aprovada. Assim, mantenho meu estudo habitual para as alterações em matéria criminal e contribuo, ainda que de forma mínima para aqueles que vão realizar o próximo exame de ordem, pois sendo o projeto uma questão iminentemente próxima de ser aprovada, se isso ocorrer antes da elaboração das provas, é muito provável que tenha alguma questão envolvendo a reforma do CPP. Vamos lá!

Dentre os artigos modificados, 282 ao 315 são estabelecidas as regras gerais para aplicação de medidas cautelares, como prisão, fiança, internação provisória, proibição de frequentar determinados locais etc.  Os artigos 317 e 318 estabelecem a prisão domiciliar. Quanto os artigos 319 a 350, vão estabelecer as medidas cautelares e critérios específicos sobre a sua aplicação.

Inicialmente, verifica-se que o Título IX, anteriomermente “DA PRISÃO E DA LIBERDADE PROVISÓRIA”, passa a ser “DA PRISÃO, DAS MEDIDAS CAUTELARES E DA LIBERDADE PROVISÓRIA”.

No primeiro artigo a qual recai a alteração, o 282 do CPP, há a supressão da prisão decorrente da sentença de pronúncia, o que faz crer, conforme a leitura da justificativa do projeto, que a intenção do legislador é manter como modalidades de prisão apenas a em razão de flagrante, temporária, preventiva e a decorrente de sentença condenatória transitada em julgado, haja vista que a para a doutrina, a modalidade revogada constitui forma de antecipação de pena. O artigo vem a iniciar o rol de incisos reguladores da concessão de medidas cautelares, que devem observar o seguinte, in verbis:

I - necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais; 
II - adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado. 

§ 1o  As medidas cautelares poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente. 
§ 2o  As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público. 
§ 3o  Ressalvados os casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida, o juiz, ao receber o pedido de medida cautelar, determinará a intimação da parte contrária, acompanhada de cópia do requerimento e das peças necessárias, permanecendo os autos em juízo. 
§ 4o  No caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas, o juiz, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva (art. 312, parágrafo único). 
§ 5o  O juiz poderá revogar a medida cautelar ou substituí-la quando verificar a falta de motivo para que subsista, bem como voltar a decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem. 
§ 6o  A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 319).” (NR) 

Percebe-se que o legislador procurou restringir as hipóteses de aplicação das cautelares para casos de inegável necessidade. Temerária é a hipótese do inc. II quando se refere às condições pessoais do acusado, pois acaba por atrelar, como a habitual rotulação dos indivíduos feita em juízo, ao desfecho do caso.
Neste artigo, atinente ao que prevê o § 2º, que há uma incoerência quanto às normas constitucionais, pois admite a possibilidade de que as medidas cautelares sejam decretadas pelo juiz de ofício. Será mais uma abertura no ordenamento, ao contrário do que prevê a Constituição ao eleger o sistema acusatório, para a ação de um juiz-ator.
Em resumo, o presente artigo traz as hipóteses que ensejam a decretação de medidas cautelares conforme a necessidade para a aplicação da lei penal, investigação ou instrução, bem como para evitar a prática de infrações penais; diante da gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições do imputado, prescrevendo ainda permissão para sua cumulação.
Na redação anterior, o artigo 282 previa que a prisão, salvo em flagrante, seria decorrente de pronúncia, por determinação legal ou por ordem da autoridade judicial.

No artigo seguinte, 283, confirma-se a intenção do legislador na manutenção das modalidades de prisão anteriormente referidas. Assim define o texto: “Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.”
Em seu parágrafo 1º, é estabelecido que as medidas cautelares se aplicam apenas às infrações em que não sejam cominadas pena privativa de liberdade e, o seu parágrafo 2º, mantém o que antes estava disposto no caput do artigo.

Artigo 289 - trata da prisão do agente que se encontrar em comarca diversa da que é competente o juiz processante, quando em território nacional. Os parágrafos do artigo trazem a possibilidade de o juiz, havendo urgência, de requisitar a prisão por qualquer meio de comunicação, devendo especificar os motivos e, se houver, o valor da fiança. A autoridade que efetivar a prisão deverá averiguar a veracidade do mandado e o juiz processante “deverá providenciar a remoção do preso no prazo máximo de 30 (trinta) dias, contados da efetivação da medida.”

Artigo 299 - se refere à captura do agente, sob as mesmas condições de requisição por quaisquer meios de comunicação, no mesmo raciocínio do artigo antecedente.

Artigo 300, anteriormente facultava a separação no estabelecimento prisional de presos provisórios e presos definitivos. Com a nova redação, passa a ser obrigatória a separação, conforme a LEP.

Artigo 306 - trata da comunicação da prisão ao juiz, MP e para pessoas da família, pelo preso indicadas; a remessa do auto de prisão em flagrante ao juiz competente, ao patrono ou defensor público, e ao agente, a nota de culpa.
Artigo 310 – in verbis:

Art. 310.  Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente: 
I - relaxar a prisão ilegal; ou 
II - converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou 
III - conceder liberdade provisória, com ou sem fiança. 
Parágrafo único.  Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação.

Mais adiante, foi alterado o artigo 311 do CPP. Apesar das críticas doutrinárias nesse sentido, o artigo teve a sua redação, quanto aos poderes instrutórios do juiz, mantida, permitindo ao mesmo a decretação de prisão preventiva de ofício, faculdade que não se coaduna com o modelo acusatório, conforme anteriormente exposto.

Mais adiante há os critérios para que a preventiva seja decretada. Assim prevê o artigo 312 com a redação modificada pelo projeto:
“Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.
Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4º).”

A única modificação no texto é em relação ao parágrafo único, que permite a decretação da preventiva no caso de descumprimento de outras cautelares.

O artigo 313 traz as hipóteses para decretação da preventiva para “os crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos”, condenação anterior transitada em julgado por crime doloso (reincidência), violência contra a mulher, nos termos da Lei 11.340/06, ainda contra idoso, enfermo ou pessoa com deficiência.

Na redação do artigo 313 vigente, a preventiva pode ser decretada em se tratando de crimes punidos com reclusão, detenção – ressalva-se aqui que o crime de vadiagem, previsto como hipótese não mais figura o ordenamento jurídico vigente –, ou no mesmo caso de reincidência e violência contra a mulher. Percebe-se que a alteração pode trazer uma ampliação das hipóteses, mas que sofrerá uma limitação quanto aos crimes punidos com pena máxima não superior a 4 (quatro) anos, fato que, atualmente, qualquer delito punido com reclusão pode ensejar a decretação de prisão preventiva, mas em que se deve cuidado, pois a medida aplicada não pode superar o prazo previsto como pena máxima a um delito.

Nos artigos 314 e 315 do Projeto há, respectivamente, permissividade para que o juiz deixe de aplicar a preventiva se o imputado for pessoa inimputável, nos termos dos incisos I, II e III do art. 23 do Código Penal e, a reassegurada necessidade do decreto prisional ser devidamente fundamentado quando concessivo, substitutivo ou denegatório da ordem, como já assevera o artigo 93, inc. IX da CRFB/88.

Os artigos 317 e 318 inovam ao estabelecer diretamente a prisão domiciliar e seus requisitos. Anteriormente versavam sobre a apresentação espontânea do acusado. Vale a pena a transcrição dos artigos 317 e 318:

Art. 317. A prisão domiciliar consiste no recolhimento do indiciado ou acusado em sua residência, só podendo dela ausentar-se com autorização judicial.”
Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for:
I – maior de 80 (oitenta) anos;
II – extremamente debilitado por motivo de doença grave;
III – imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com deficiência;
IV – gestante a partir do 7º (sétimo) mês de gravidez ou sendo esta de alto risco.
Parágrafo único. Para a substituição, o juiz exigirá prova idônea dos requisitos estabelecidos neste artigo.”

O texto também retira do Código a prisão administrativa, elencada nos artigos 319 e 320, integrando os artigos ao capítulo destinado a definir as outras modalidades de medidas cautelares que não a prisão.

Entre outras alterações, encontram-se previstas nos artigos, a faculdade de o juiz revogar ou substituir a medida aplicada, a entrega de passaporte, com a finalidade de coibir a fuga para o exterior.


O artigo 319, com a redação dada pela Lei passa a estabelecer medidas cautelares diversas da prisão. Na redação atual (anterior à Lei), estava previsto no artigo a prisão administrativa, espécie extirpada do Código pela nova reforma processual penal.  As medidas cautelares se compõem das seguintes modalidades, in verbis:

I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades;
II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;
III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante;
IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução;
V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos;
VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais;
VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração;
VIII - fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial;
IX - monitoração eletrônica. 

Estas são medidas que serão aplicadas pelo juiz, isoladas ou cumulativamente, quando convenientes à instrução criminal. Encontram-se elencadas nos incisos do artigo 319 as chamadas cautelares de natureza pessoal, consoante recaem sobre o indivíduo diretamente.

Inovação trazida no texto é a previsão da cautelar de monitoramento eletrônico, já prevista na recente Lei 12.258, editada em de 15 de junho de 2010, que alterou alguns dispositivos da LEP. Agora, mormente em decorrência da previsão na legislação material, a cautelar não somente está apta a produzir efeitos na fase da execução penal, como também durante a fase de instrução.

Ao artigo 320 destinou-se reger a possibilidade de o imputado se ausentar do país, quando houver restrição neste sentido, a que o mesmo será obrigado a apresentar perante a autoridade competente o passaporte no prazo de 24 (vinte e quatro) horas.

Impera-se no artigo 321 o mandamento que aduz dever ao magistrado, sobre conceder a liberdade provisória ao imputado aplicando, quando for o caso, a respectiva cautelar dentre as elencadas no artigo 319, desde que previamente observados os requisitos inscritos no artigo 282.

Sobre o instituto da fiança foram destinadas várias alterações perante a legislação editada, por isso cabe reservar-lhe comentários mais minuciosos.

Na dicção do artigo 319, VIII, a fiança é medida cautelar que poderá ser concedida com a finalidade de se evitar a restrição da liberdade do agente, mas de forma a garantir, em linhas gerais, a contribuição do imputado ao procedimento sem que este venha a prejudicar o seu regular andamento, e enquanto não ocorrer decisão definitiva, isto é, o trânsito em julgado da sentença penal condenatória (art.334 do CPP), retendo-se os objetos e o dinheiro dados, ainda que advenha superveniente prescrição (art. 336 do CPP) para solver as custas, indenização do dano, prestação pecuniária e da multa, em havendo condenação. Mas havendo absolvição ou a fiança for declarada sem efeito, o valor prestado será restituído sem desconto, ressalvado o previsto no parágrafo único do supracitado artigo 336 do CPP.

Encontra-se previsto no artigo 322 que a fiança é cabível nos delitos em que a pena máxima privativa de liberdade não seja superior a 4 (quatro) anos, mas a critério da autoridade judicial, poderá, após decisão em prazo não superior a 48 (quarenta e oito) horas, ser concedida a delitos com pena superior ao previsto, conforme estipula o parágrafo único do referido artigo.

O artigo 323 vem a elencar as hipóteses em que a fiança não será permitida em decorrência da lesividade acometida ao bem jurídico penalmente tutelado pela norma, quais sejam os seguintes: crimes de racismo, tortura, tráfico ilícito de entorpecentes, terrorismo e hediondos, e nos crimes cometidos por grupos armados “contra a ordem constitucional e o Estado Democrático”.[i]

Igualmente não será concedida a fiança se houver a quebra da mesma, sem justo motivo, perante as obrigações elencadas nos artigos 327 e 328 do CPP[ii], havendo prisão civil ou militar decretada e, por fim, se preenchidos os requisitos para a decretação da prisão preventiva.

Em contraponto ao que é previsto na redação ainda vigente do Dec-Lei. 3.689/41 sobre permissividade ou negativa de concessão de fiança, existe uma abrangência maior de infrações a que se possa cominá-la com o advento da Lei 12.403/11, o que antes só era possível apenas aos delitos punidos com penas de detenção ou prisão simples, excetuando-se aqueles em que a pena mínima cominada for superior a dois anos, contravenções de vadiagem e mendicância (esta última expressamente revogada pela Lei 11.983/09 e pela própria Constituinte de 88), condenação por delito com pena privativa de liberdade transitada em julgado, em crimes com clamor público, violência contra a pessoa ou grave ameaça etc.

Acerca dos critérios de fixação do valor da fiança a Lei veio a instituir um teto maior, tendo sido aumentado para até 100 (cem) salários mínimos o limite quando de infrações com pena privativa de liberdade máxima de quatro anos e, sendo superior a este montante de pena, o limite é fixado em 200 (duzentos) salários mínimos. Dentre os valores, estabelece o § 1º do artigo 325, que, diante da “situação econômica do réu”, o juiz poderá dispensar a fiança, segundo a previsão do artigo 350 do CPP[iii], reduzi-la “até o máximo de dois terços” ou, diversamente, aumentá-la “em até 1.000 (mil) vezes”.

Sendo retardada a concessão da fiança por parte da autoridade policial, esta poderá ser pedida ao juiz competente, tanto pelo preso ou por representante, via de petição simples, a ser decidida no prazo máximo de 48 (quarenta e oito) horas (art. 335, CPP).

Os artigos 341, 343, 344, 345 e 346 sob a nova redação tratam da quebra e perda da fiança.
A quebra da fiança pressupõe que o imputado se mostra contrário à manutenção do procedimento, para tanto se omitindo ao comparecimento ou se opondo ao cumprimento de obrigações a ele impostas, praticando ato que obste o regular andamento procedimental ou praticando nova infração dolosa (art. 341). Com a quebra, o valor prestado poderá será perdido à metade e a autoridade judicial competente decidirá pela imposição de outras medidas cautelares ou mesmo pela imposição da prisão preventiva (art. 343) e, perdido na totalidade caso não compareça para cumprir a sanção imposta definitivamente (art. 344). Os valores deduzidos da fiança quando esta for quebrada, serão transmitidos ao fundo penitenciário, na forma dos artigos 345 e 346[iv].

Por fim, a Lei estabelece no artigo 439 que o “exercício efetivo da função de jurado constituirá serviço público relevante e estabelecerá presunção de idoneidade moral”, e inclui no Código de Processo Penal o artigo 289-A, que trata do banco de dados a ser instituído pelo CNJ em que será feito o imediato registro de mandados de prisão expedidos pelas autoridades judiciais do país, que permite a qualquer autoridade policial efetuar a prisão após verificada a autenticidade do mandado, que deverá ser comunicada ao juiz que a decretou, podendo o agente verificar acerca da identidade daquele a quem se pretende restringir a liberdade, aplicando-lhe o disposto no § 2o do art. 290[v], devendo ainda informar ao preso todos os seus direitos, conforme estabelece o inc. LXIII do artigo 5º, da Carta Magna, e fazendo ciente a defesa do mesmo, seja por advogado ou através da Defensoria, quando não for informado ou não houver causídico para representá-lo.

Conclui-se que em alguns dispositivos, a intenção do legislador foi a de restringir o uso banalizado da prisão preventiva, limitando as hipóteses de incidência, mas trazendo a aplicação de medidas cautelares mais adequadas à situação do imputado. Outrossim, para cautelares como a de monitoramento eletrônico e prisão domiciliar não se pode aferir de imediato qual a sua real consequência no sistema vigente, haja vista que é indiscutível a seletividade por determinados indivíduos, o que faz com, v.g. que o uso de uma pulseira, dada a sua visibilidade, venha a trazer marcas à constituição e definição da imagem do indivíduo.

Corroborando, a própria mídia faz com que se crie em torno de tal medida uma sensação de impunidade e segurança, pois transmite a ideia de que qualquer indivíduo em qualquer grau de cumprimento de pena, pode se beneficiar da cautelar, significando um alarde na opinião pública, em que, para a mente da população que os mais perigosos ficarão livremente circulando dentro da sociedade...


[i] Art. 323, III, CPP.
[ii] Art. 327.  A fiança tomada por termo obrigará o afiançado a comparecer perante a autoridade, todas as vezes que for intimado para atos do inquérito e da instrução criminal e para o julgamento. Quando o réu não comparecer, a fiança será havida como quebrada.
Art. 328.  O réu afiançado não poderá, sob pena de quebramento da fiança, mudar de residência, sem prévia permissão da autoridade processante, ou ausentar-se por mais de 8 (oito) dias de sua residência, sem comunicar àquela autoridade o lugar onde será encontrado.
[iii] Segundo o artigo 350, se for impossível ao réu a prestação da fiança, o juiz poderá dispensá-la e conceder-lhe liberdade provisória, desde que o mesmo se comprometa com o feito segundo o que regulamentam os artigos 327 e 328 do CPP. Lembrando-se que, quebrada a fiança sem justo motivo ou houver prática de nova infração
[iv] Art. 345.  No caso de perda da fiança, o seu valor, deduzidas as custas e mais encargos a que o acusado estiver obrigado, será recolhido ao fundo penitenciário, na forma da lei.” (NR) 
Art. 346.  No caso de quebramento de fiança, feitas as deduções previstas no art. 345 deste Código, o valor restante será recolhido ao fundo penitenciário, na forma da lei.” (NR) 
[v]  2o  Quando as autoridades locais tiverem fundadas razões para duvidar da legitimidade da pessoa do executor ou da legalidade do mandado que apresentar, poderão pôr em custódia o réu, até que fique esclarecida a dúvida.