"QUALQUER UM PODE JULGAR UM CRIME TÃO BEM QUANTO EU, MAS O QUE EU QUERO É CORRIGIR OS MOTIVOS QUE LEVARAM ESSE CRIME A SER COMETIDO." (CONFÚCIO)

quinta-feira, 21 de abril de 2011

E quando o livre convencimento não está tão livre assim: o magistrado e a influência midiática traduzida ao processo

Todos os dias surgem novos casos em que há um grande envolvimento público, através da imensa quantidade de reportagens apresentadas pela mídia, que infligem à sociedade um sentimento de revolta e impunidade perante as instituições jurídicas do país.
Os fatos do dia-a-dia são, assim, transformados em grandes manchetes que, em geral, relatam a ineficiência do Poder Judiciário na aplicação da sanção adequada ao caso. Mas não pára por aí.
As informações, que com a integração do regime capitalista nas relações mundiais, há muito se tornaram um produto a ser consumido, fez com que os meios de comunicação adquirissem a estrutura de empresa, dentro do mercado global. Desta forma, para atingir o mercado consumerista é que a imprensa traduz às suas notícias uma linguagem parcial que busque alcançar o interior dos indivíduos, por vezes empregando um tom sensacionalista.
É assim que os meios de comunicaçãm, ao influir diretamente no subconsciente dos indivíduos, transformam a ídeia de opinião pública em uma opinião publicada: as opiniões dos indivíduos apenas transmitem a opinião dos jornalistas e grupos de comunicação.
Não é estranho então, que, influindo de tal forma na opinião pública, a mídia tenha se tornado um grupo de pressão especializado às proposições legislativas do país. Não bastante, através de tal pressão midiática a sociedade preza por leis que tragam um maior rigor punitivo; leis que sejam mais "duras" e que venham a reprimir a violência e criminalidade existente.
O problema da ingerência midiática é quando esta se transporta ao processo, agregando valores e modificando os rumos da decisão judicial.
É certo que o processo penal possui suas limitações inscritas na Carta Magna, como o de ser observado o direito ao contraditório e ampla defesa (art. 5o, LV) e o estado de inocência (art. 5o, LVII) entre outros.
Interessa aqui a regra inscrita no artigo 93, IX, da CRFB/88, regra bastante conhecida pelos acadêmicos de Direito que afirma, in verbis:
Art. 93 (...)
IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
Este princípio, traz a limitação das decisões judiciais, acarretando a sua ausência como nulidade e, o sigilo processual, quando houver necessidade de salvaguardar o direito à intimidade do interessado.
O sigilo necessário ao esclarecimento processual também é regra prevista no artigo 20 do Código de Processo Penal.
O problema é que nem sempre esse sigilo é decretado, vindo o processo a sofrer grande interferência das notícias divulgadas diariamente quando um caso ganha repercussão pública. Muitas vezes, as informações noticiadas pelos jornalistas são divulgadas pelas próprias autoridades condutoras do caso.
É onde se concentra todo o problema: pois o processo é presidido por um juiz, que é um ser humano como qualquer um de nós. Um ser humano que é parte efetiva da sociedade, que também tem os seus anseios pessoais e suas convicções próprias. Como diz o Prof. Paulo Rangel, não é o magistrado um ser alheio, que vem de outro planeta, julga e depois vai embora; ele é integrante da realidade, mas que às vezes se afasta da imparcialidade ao aplicar a lei ao caso concreto.
Temos então, outra limitação à atuação do magistrado no processo penal: o princípio da imparcialidade. Por este princípio o magistrado deve se manter inerte e alheio à atuação processual, julgando os autos com base no que as partes apresentam como meios de prova e realizando o devido controle de legalidade quando suscitado à fazê-lo.
Porém, há alguns juízes que, devido ao que a mídia propaga, prezam por atuar constantemente, além dos limites de um sistema acusatório, atitudes incompatíveis com a verdadeira função do Estado- juiz no processo e com o que garante a Constituição.
Assim, é visível em algumas decisões, que os magistrados se utilizam de fundamentos condenatórios baseados no clamor público, na opinião pública, julgando através de parâmetros estabelecidos pela lei abstrata da mídia, com mais rigor ao caso concreto, buscando, conforme suas convicções pessoais, fazer justiça em prol da sociedade.
Não é esta a atuação que se quer daquele que é o titular do direito estatal de decidir sobre o bem maior do ser humano enquanto vivo, que é a sua liberdade. O juiz vem a atropelar todas as garantias e direitos fundamentais e limitações ao exercício de sua função quando se posta por uma atuação avessa ao que pretende a nossa Constituição garantista. Há casos em que mesmo da nítida ausência de provas, para a qual o CPP prevê absolvição, o juiz vem a condenar, apenas pelos estigmas e pressão midiáticos existentes. Para não dizer quando o faz em nome de um sentimento ferido que o Judiciário vive frente à mídia, que transmite ao povo a ineficiência do mesmo.
Processualmente, às partes cabe apenas um controle sobre a decisão de forma racional, aquém dos dispositivos que limitam as decisões do magistrado, no que tange aos requisitos para a elaboração de uma decisão, haja vista que não se pode conhecer verdadeiramente o que se passa em foro íntimo do magistrado. Apenas se pode reconhecer quando uma decisão proferida extrapole os limites da legalidade processo-constitucional penal.
Por fim, resta consignar que é imprescindível a manutenção da imparcialidade do julgador e, que cabe às partes, seja acusação, seja defesa, verificar no caso concreto a viabilidade de decretação do sigilo processual, para que o processo não tome um efeito condenatório maior e irreparável ao imputado, pois é justo que este cumpra uma sançã na medida do delito cometido, mas não além desta em prol de um bem coletivo que, na verdade, esconde interesses de grupos que detém o controle da sociedade, como as agências da mídia.

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