"QUALQUER UM PODE JULGAR UM CRIME TÃO BEM QUANTO EU, MAS O QUE EU QUERO É CORRIGIR OS MOTIVOS QUE LEVARAM ESSE CRIME A SER COMETIDO." (CONFÚCIO)

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Informativo 637 do STF - Prisão preventiva: nova lei e falta de fundamentação


"Ao aplicar a nova redação do art. 313, I ,do CPP [“Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva: I - nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos”], alterado pela Lei 12.403/2011, a 2ª Turma concedeu habeas corpus para cassar o decreto de prisão preventiva exarado em desfavor dos pacientes. Na espécie, eles foram acusados pela suposta prática dos delitos de resistência (CP, art. 329) e de desacato (CP, art. 331), ambos com pena máxima abstratamente cominada de 2 anos de detenção. Apontou-se que, com as inovações trazidas pela referida lei — a qual dispõe sobre matérias pertinentes à prisão processual, fiança, liberdade provisória, e demais medidas cautelares — a segregação, no caso, seria imprópria. Ademais, entendeu-se que o magistrado não reunira dados concretos hábeis a justificar a necessidade da constrição cautelar como meio necessário e inafastável para se resguardar a aplicação da lei penal. Ao contrário, assinalou-se que fora utilizado formulário padrão, previamente elaborado, o que evidenciaria, de forma flagrante, a ausência de individualização dos decretos prisionais."

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No julgamento do Habeas Corpus 107617/ES, em que atuou como Relator o Min. Gilmar Mendes, a Suprema Corte apresenta entendimento no sentido de reforçar o paradigma inserto no ordenamento processual penal pátrio pela Lei 12.403 de 04 de maio de 2011. 
Com a alteração da legislação processual, a aplicação do artigo 313 do CPP exige a observância dos requisitos elencados no art. 312 para a decretação da prisão preventiva ("garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria"), devendo o magistrado demostrar fundamentadamente a sua necessidade, conforme regra prevista na nova redação do art. 315 do mesmo diploma legal.
Ante a anterior ausência de expressa previsão no CPP acerca da necessidade de fundamentação do decreto prisional, apesar de constitucionalmente inscrita (art. 93, IX c/c art. 5º da CRFB/88), a prática forense demonstra que é corriqueira a decretação da prisão preventiva em que o magistrado apenas afirma existirem os requisitos, sem, contudo, enfrentar a situação que lhe é apresentada no processo, conforme mencionado na ementa do julgado acima transcrito.
Extrai-se da decisão que o relator considerou a "padronização" do documento utilizado pelo juízo coator, em que "constam espaços apenas para o preenchimento do número do processo, do nome do réu, da data designada para a audiência e da data de assinatura", ato que fere a individualização dos decretos prisionais, conforme requer o mandamento processual.
Por inobservância dos requisitos da nova lei, o relator destacou que, conforme há a omissão do magistrado no enfrentamento dos requisitos, a posição conservadora perante o processo impediu que fosse aplicada medida cautelar diversa da prisão, haja vista que o crime a que estão incursos os pacientes é cominada pena abstrata privativa de liberdade máxima inferior a 4 anos, que impede, a teor do inc. I do art. 313 do CPP, a decretação da prisão preventiva.
Desta forma, nos termos do art. 282 c/c art. 313 do CPP, ambos reformados pela Lei 12.403/11, existe nova possibilidade de se manter o acusado vinculado ao processo sem que para isso seja imprescindível a decretação de medida cautelar restritiva de liberdade, para que, frente ao caso concreto, a desmedida utilização da prisão preventiva não venha a produzir uma antecipação de pena que ao final do processo se mostre desproporcional ao caso concreto.
É certo que tal postura dos magistrados no cenário brasileiro decorre das raízes da legislação processual penal, que tiveram origem em uma época em que a autonomia do Poder Judiciário foi substituída pelo controle político ditatorial vigente em que a posição do julgador era de preservação do Estado contra o indivíduo, suprimindo-lhe garantias e aumentando o poder de fiscalização das autoridades públicas em seu desfavor.
Espera-se, por fim, que com as reformas legislativas até então apresentadas ocorra uma mudança na difícil tarefa de julgar e consequentemente na postura dos magistrados frente ao imputado. Busca-se mais e mais um processo que reforce as normas constitucionais, a fim de que se alcance um maior status democrático no regular desenvolvimento dos processos, visível, conforme têm demonstrando as cortes superiores nas decisões proferidas através de uma mudança de rumos.